segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Vídeo de Natal da DST

 Vale a pena fixar a atenção neste vídeo de Natal.

Para além do rigor e da perfeição da sua execução técnica, a seleção das imagens sincronizam uma poderosa mensagem: de como os grandes valores transformam a atividade humana, o trabalho mais simples ou mais complexo, a superfície do quotidiano, a rugosidade da matéria, o olhar, o desejo, o símbolo, o horizonte do limite noutra coisa sem a qual, quase tudo faltaria. Claro, os valores dão-nos asas se... verdadeiramente cultivados na vida e no coração de cada um. Acho que é aí que está o segredo desta Empresa. De outro modo, este vídeo de natal não significaria Natal «do Belo, do Bem e da Verdade»!
Gosto mesmo!

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

A partilha da “Palabre” na Filosofia Africana

No presente semestre, a viagem intelectual proposta aos meus alunos teve como destino África. Precisamente, a Filosofia Africana, na sua problemática caracterização geral e nas suas expressões mais específicas, nos domínios da ética, da arte, da linguagem, da religião, da política... 

Dos muitos conceitos e perspetivas merecedoras de refletida atenção, os filósofos africanos
propõem-nos, no campo social e político, a recuperação de um conceito - que é também uma "praxis" - que tem gerado na turma muito interesse e debate. Trata-se da experiência comunitária da partilha da Palabre/Palavra, a que eles atribuem uma importância notável.

Este termo, e mais especificamente a expressão “l’Arbre à Palabres” (Árvore das palavras), designa o lugar tradicional de reunião, à sombra da qual a comunidade se exprime e ouve a palavra dos mais velhos, discutindo e tomando posição sobre os múltiplos aspetos da vida em sociedade, sobre os problemas da aldeia, sobre a política, uma discussão alargada e em palavras simples. É também o lugar onde as crianças vêm ouvir contar histórias pelo ancião da comunidade. Por extensão, a expressão pode indicar, também, o sítio da aldeia onde se encontrava a tal “árvore das palavras”, geralmente uma árvore de baobá. Noutras latitudes, pode ainda referir o local onde os estudantes se reúnem para discutir a sua vida social e universitária. Do ponto de vista político, "jurídico" e também ético, esta tradição incorpora um significado de fonte da legitimação "democrática" da decisão da comunidade, a raiz ancestral de uma prática de consenso; socialmente simboliza, também, a força humana do grupo de pertença e naturalmente a importância das relações sociais.

Como se percebe, ao exercício desta permuta de palavras é reconhecida uma função comunicativa e fundadora. Muitos filósofos africanos revalorizam esta experiência, por ser fortemente identitária e potenciar o pluralismo típico das sociedades tradicionais, onde o consentimento público é negociado segundo práticas codificadas pela oralidade.

Para além de muitos outros aspetos que tornam este conceito de grande interesse para pensar a sociedade, parece-me possuir grande potencial para tempos de crise, como o que estamos vivendo.

O romance A Árvore das Palavras (1997), da escritora portuguesa Teolinda Gersão dá-nos uma certa imagem e evocação dessa realidade, vivenciada em Moçambique, pouco antes da independência.

Os movimentos “Ondjango” em Angola e “Djemberém” na Guiné Bissau são atuais continuadores das tradições da “Árvore das Palavras”; nesta linha, ver os materiais:

- Podcast “Ondjango, Arminda Fernando Filipe”

- Filme Djemberém ou la hutte du dialogue, Filme de Cinzia d'Auria (2013 - Guinée-Bissau). Realizado pelo grupo Fifito & Bumbulum, um grupo composto por artistas da Guiné-Bissau, dentre eles Filomeno Lopes e pela associação Zoe Onlus. Obra de homenagem às tradições da África Ocidental, onde o «Djemberém» refere a cabana do diálogo, lugar onde, segundo os usos e costumes, os anciãos se reúnem para discutirem e procurar soluções às diversas controvérsias sociais.

Bibliografia complementar

 Fweley Diangitukwa. “La lointaine origine de la gouvernance en Afrique: l’arbre àpalabres” in Revue gouvernance, été 2014.

Ghiggi, Gomercindo; Kavaya, Martinho. “Freire y Ondjango: diálogos con la experienciavital del mundo angoleño”. Recerca: revista de pensament i anàlisi, [en línea], 2009, n.º 9, pp. 103-121.

Sopova, Jasmina. “Arbres à palabreset systèmes occidentaux” in: Le Courrier de l'UNESCO, 52, 5, p. 42.

domingo, 22 de novembro de 2020

Arte Contemporânea e Estética do Essencial

Intervenção na 5ª Sessão da Xª Jornada de Teologia Prática, dedicada ao tema: "O Apelo do Essencial", com a comunicação "Arte Contemporânea  e Estética do Essencial".
Esta Sessão, lançada online no passado dia 05 de novembro, contou, também, com a participação do Colega Joaquim Félix de Carvalho, Professor da Faculdade de Teologia; foi moderada pela Professora Clarisse Pessôa (FFCS-UCP) e teve como anfitrião o Professor Luís Figueiredo Rodrigues (Diretor da FT-Braga).
A organização da Jornada foi da responsabilidade da Faculdade de Teologia da UCP.



quinta-feira, 2 de abril de 2020

Pensamento oriental


A revista Religare - periódico semestral do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba - publica regularmente trabalhos de investigação sobre as grandes correntes do "Pensamento oriental", expressão da nossa preferência por nela integrar os diversos componentes das ancestrais sabedorias: elementos filosóficos, religiosos, culturais, espirituais. 
São trabalhos de interesse para o conhecimento, entre outras, das correntes do Hinduísmo, Budismo, Jainismo, Confucionismo, Taoismo.
Destacamos aqui dois fascículos, com a indicação completa dos respetivos índices, estando os seus artigos todos eles disponíveis em livre acesso. 
Aos interessados nestes assuntos, recomendamos a pesquisa em todos os outros fascículos da mesma revista, já que se encontram muitos outros contributos ao longo dos 32 fascículos que a revista contabiliza até à presente data.


VOLUME 12, n. 2 (2015): dossiê “Religiões, Filosofia e Espiritualidades Chinesas”

> Editorial - Matheus da Cruz e Zica: 226-229
> A arte, a magia e os deuses: trilhar as tradições de Macau - Mônica Simas: 230-243
> Rota da seda: trânsitos culturais e sagrados nos caminhos da China - Maria Lucia Abaurre Gnerre: 244-259
> Do karatê ao kung fu: cinema, religião, elementos marciais e religiosos japoneses e chineses e sua recepção no Brasil (1984-2010) - José Otávio Aguiar: 260-277
> Um TAO Descartes - Matheus da Cruz e Zica: 278-294
> O pensamento chinês: filosofia ou religião? - Joaquim Antônio Bernardes Carneiro Monteiro: 295-314
> TRADUÇÃO: A Sociedade Taoísta do Brasil e a globalização do Daoismo da Ortodoxia Unitária - Daniel M. Murray, James Miller: 315-343 (Tradução de Matheus Costa e Fábio Stern)
> ARTIGO LIVRE: Concepções e ritos de morte na Jurema paraíbana - Dilaine Soares Sampaio: 344-369
> RESENHA - GNERRE, Maria Lúcia Abaurre; POSSEBON, Fabrício (orgs.). China Antiga: aproximações religiosas, Matheus Oliva da Costa: 370-377

VOLUME 9, n. 2 (2012): dossiê "Religiões Orientais"

> Editorial - Maria Lucia Abaurre Gnerre, 113-117
> O PROBLEMA DO MAL E A TEODICÉIA OCIDENTAL. O QUE O TEÍSMO E NÃO-TEÍSMO INDIANOS TEM A DIZER SOBRE ESTE DESAFIO? - Puroshotama Bilimoria, 118-140
> DHARMAKAYA & NIRVANAKAYA: CORPOS DE ÊXTASE NA POESIA DE AUGUSTO DOS ANJOS - Sandra S F Erikson, 141-152
> CECÍLIA MEIRELES E A ÍNDIA: DAS PROVISÓRIAS ARQUITETURAS AO “ÊXTASE LONGO DE ILUSÃO NENHUMA” - Gisele Oliveira, 153-161
> TRADUÇÕES DA LITERATURA FICCIONAL INDIANA PARA O PORTUGUÊS: UMA QUESTÃO CULTURAL - Gisele Lemos, 162-166
> RELIGIÃO, EDUCAÇÃO E MARCIALIDADE NA FORMAÇÃO HISTÓRICA DO KUNG FU: ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE UM CAMPO DE PESQUISAS RECENTE NO BRASIL - Matheus da Cruz Zica, 167-176
> YOGA PARA CRIANÇAS – UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃO -Maria Claurenia de Andrade Silveira, 177-185
> O CONCEITO DE FELICIDADE NA BHAGAVAD-GITA: SIMILARIDADES E CONTRASTES COM O PARADIGMA HEGEMÔNICO NO OCIDENTE - Thiago Pelucio Moreira, 186-194
> MORTE NO HINDUÍSMO: TRANSMIGRAÇÃO E LIBERTAÇÃO - Lucio Valera, 195-204
> POSTULADOS DO VEDANTA: CONTRIBUIÇÕES DE VIVEKANANDA PARA TRANSFORMAÇÃO SOCIAL A PARTIR DO REPOSICIONAMENTO DO SUJEITO DIANTE DE SUA EXISTÊNCIA, SIGNIFICADO E VALORES - Livia Borges Lopes, 205-218
> A REPRESENTAÇÃO DA MULHER E DA NATUREZA NO BUDISMO MEDIEVAL - Zelia Bora, 219-228
> CRÍTICA BUDISTA DE NIETZSCHE - Derley Menezes Alves, 229-243
> A NATUREZA DA VACUIDADE A LEITURA DO PRAJNĀ PĀRAMITĀ A PARTIR DE O ORNAMENTO DA CLARA REALIZAÇÃO DO BUDA - Deyve Redyson, 244-251

terça-feira, 31 de março de 2020

Filosofia Portuguesa: pensamento aberto à pluralidade



Por ocasião da publicação da monumental obra intitulada "História do pensamento filosófico português", a jornalista Raquel Santos entrevistou Pedro Calafate [PC], Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, e Coordenador da referida obra.

Do interessante diálogo, retemos alguns pontos que nos parecem bastante significativos, seguindo de muito perto a explanação de PC.

Desde logo, a questão da existência, ou não, de um pensamento, ou mais propriamente, de uma filosofia “portuguesa”, própria e específica, enquanto tal. Trata-se de um problema persistente ao longo do tempo, mas avivado, sobretudo, no séc. XX, e de cuja abordagem não se pode cindir o modelo de filosofia que se instalou na mente coletiva, a saber, um modelo de reflexão sistemática e sistematizadora, argumentativa, ordenada segundo uma disciplina lógica, rigorosa hierarquizada, que lhe garante a unificação, e de que as tradições germânica, inglesa, francesa, são os melhores representantes. Há que convir que este modelo não é o mais corrente entre nós, não é o mais praticado pelos nossos intelectuais, pelos pensadores.
Entre nós toma lugar, frequentemente, um pensamento mais indisciplinado, no “sentido em que percorre várias áreas do saber”, se adentra e se mistura com outras áreas que não apenas a área da Filosofia. Os diversos temas filosóficos expressam-se abundantemente nos domínios da literatura, da poesia, da parenética, isto é, em textos, que à primeira vista não seriam textos tecnicamente filosóficos, como são considerados, tradicionalmente, os tratados.  
Porém, não é esta “dispersividade” que caracteriza primordialmente o núcleo do nosso pensamento. Como diz PC, “há ritmos”, há tendências a que é preciso dar atenção, e que até podem contradizer essa miscigenação de géneros discursivos a que somos tão propensos. Por exemplo, recorda PC, há duas grandes escolas do pensamento filosófico português que atingiram enorme projeção: a escolástica, entre nós designada por “Segunda Escolástica” ou Escolástica Renovada, obra da Companhia de Jesus e do Colégio das Artes que lhe foi confiado por D. João III, que se desenvolveu num verdadeiro espírito de rigor e como autêntico sistema. A outra escola de pensamento foi o positivismo, já no séc. XIX, também com rigor e sistematicidade. Ou seja, há que ter em conta uma certa “pluralidade de formas de expressão do pensamento” e de estilos discursivos que a filosofia adquire na cultura portuguesa, que lhe confere uma riqueza enorme e que exige do intérprete e do estudioso uma grande ginástica. É sempre um grande desafio.

PC faz referência à influência da heresia do priscilianismo, na fase emergente do cristianismo, e à sua tendência para o naturalismo, o culto da natureza, que vai assomando aqui e ali, em diversos autores, e particularmente nos “heterodoxos” do séc. XIX e XX: T. de Pascoaes, G. Junqueiro, Sampaio Bruno…, linhas de continuidade nas quais se acentua esse misticismo da natureza.

Também o traço do messianismo, na sua complexidade, lhe merece consideração. Não o messianismo, entendido como simples espera da vinda de um novo messias, um salvador, mas o messianismo na sua vertente mais rica para as ideias, como “crença na redenção futura da humanidade”. Precisamente, na linha de Pascoaes, como sinónimo da luta pela vitória sobre a dor, sobre o sofrimento e sobre a queda; e logo, como esperança na recuperação de uma cisão, de uma rutura sobre a qual se instalou o mundo. É neste sentido que há autores interessantes messiânicos, não cristãos, que negam o dogma cristão da criação, pois entendem que “o mundo não foi criado voluntariamente por Deus”, mas “o mundo resulta de uma queda de Deus”; por isso, Deus não é omnipotente e carece mesmo da ajuda do homem para se reerguer e assim redimir a própria criação. É deste novelo que Pascoaes assume o saudosismo, um projetar a redenção de Deus, do homem e humanidade, de um homem que “ajuda Deus decaído a recuperar-se, a reunificar-se após uma cisão misteriosa, após uma criação involuntária”.

Vem a terreiro Raul Brandão e o seu escrito O Padre, no qual se inscreve a incontornável problemática existencial nietzscheana da morte de Deus e com ela, a da perda de referências, a desarmonia e desestruturação do mundo, o não-sentido, sem balizas, “sem teto, entre ruínas”, no fundo do abismo, a modo do desesperante pessimismo dos finais do séc. XIX. Trata-se, segundo PC, “do tema mais dilacerante do nosso tempo: saber se Deus existe, ou não existe!” Perante a impossibilidade da resposta afirmativa ou negativa, fica a expressão de um desejo: “Deus existe porque a melhor parte de nós quer que Ele exista”! Raul Brandão retira a discussão do plano da fé e do dogma e trá-lo para o âmago da interrogação profunda do homem, expressando a sua revolta contra a morte; a melhor parte de nós revolta-se contra a finitude, contra a morte, a hipocrisia, projetando-se para o infinito. Raul Brandão funciona aqui como um exemplo paradigmático, mas algo esquecido, com o seu teatro existencial, os seus diários e ensaios, feitos de um lastro profundamente existencial, percursor – recorda PC – de muitos temas assumidos por Sartre, Camus…; no fundo, o mesmo espanto do homem pela descoberta de si… presente em tantos outros, como Virgílio Ferreira.

E sempre a interrogação-âncora: é disto que é feita a identidade da filosofia portuguesa? PC responde com muita prudência. Não lhe interessa a identidade em sentido estático, mas em sentido dinâmico, como “descoberta permanente” e evolutiva de nós próprios. Neste sentido, a questão da identidade não se resolve em termos científicos, antes é uma questão de resposta aberta e inacabada, trabalhosa também. E é muito elucidativa esta hermenêutica da identidade. PC afirma que ela se encontra, por exemplo, na “atmosfera” destes textos, na forma como se foram, gradualmente, elegendo determinados problemas e temáticas. Assim, entre nós, prevalecem os temas de natureza ético-política e jurídica, teológica, o tema de Deus – seja num sentido mais ortodoxo ou mais heterodoxo – está sempre presente, bem como o da organização da sociedade, dos fundamentos do Estado, origem e finalidade do poder, da ideia de Império, tudo isso são dados importantes para a ideia da construção de um destino comum, de um destino coletivo, que liga imediatamente com a questão da relação entre a Igreja e o Estado, questão que vem desde a fundação da nacionalidade até ao presente.

 A questão da identidade liga-se ao problema “Portugal”. De facto, a nossa cultura institucionalizou essa magna e persistente questão, vivida com particular ênfase pelos “estrangeirados”, mas não só. Problema que desencadeou, também, uma visão decadente e que hoje nos atinge. PC explica de modo cristalino, como passámos de uma “perspetiva de segurança profunda do nosso destino até finais do séc. XVII” e rapidamente caímos no seu oposto, para uma ideia de “povo que pouco vale”, somos como uma folha em branco a ser escrita e moldada não já por nós, mas pelos de fora, pelos europeus, que trazem a garantia e o progresso, sinónimo de modernização do País!

Por último, uma reflexão sobre o sentido da homogeneidade de pensamento do Séc. XVIII. Neste Século das Luzes há “uma grande identidade de pensamento entre os autores”. O problema que os move é, sobretudo, o combate à Escolástica e a imposição pela força do Estado absoluto e do despotismo esclarecido, de modo “a retirar Portugal do domínio da Escolástica e do modelo cultural da Companhia de Jesus”. Havia uma consciência dramática, trágica, de que Portugal estava numa via errada, tinha escolhido um caminho errado. E era preciso emendá-lo, com urgência.

Uma entrevista a rever e refletir, em todo o tempo.

sábado, 28 de março de 2020

Uma Viagem ao Pensamento Filosófico Português


Página de "Filosofia Portuguesa", organizada por Pedro Calafate [PC] (que dirigiu também a extraordinária publicação História do Pensamento Filosófico Português, Lisboa: ed. Caminho, 1999 e ss.), que pretende, sinteticamente, «fornecer um conjunto de informações básicas sobre o panorama da cultura filosófica portuguesa», no dizer do próprio.
Aí apresenta o elenco de autores e temas e respetiva bibliografia, remando contra o tão frequente "não sei nem conheço", ou até mais radical "não há nem existe", quando de filosofia portuguesa se trata, «dando lugar a um colonialismo interno de efeito pernicioso».
Logo na Introdução, PC orienta, de modo cristalino, o leitor para a legitimação do modo português de filosofar, no qual não predomina, certamente, a expressão sistemática da reflexão, mas que nem por isso deixa de revelar plena coerência, profundidade e transcendentalidade das suas orientações. Por isto mesmo, será uma filosofia mais dispersa por textos ora de «tendência adissertacional», ora mais ligados a causas distintas, sociais, políticas, estéticas, pedagógicas, religiosas, etc., exigindo o desdobramento da pesquisa e da leitura por um corpus mais dilatado, à medida dessa diversidade textual. Mas o não predomínio de uma filosofia de sistema, não significa que esta tenha estado, entre nós, totalmente ausente, como o ilustra a escolástica renovada e o positivismo.
Na referida Introdução, PC justifica a opção cronológica e o elenco apresentado, iniciando-se com Paulo Orósio e S. Martinho de Dume, e finalizando na obra de Vergílio Ferreira.
Uma página muito útil para quem deseje iniciar-se nesta viagem de aproximação ao Pensamento Filosófico Português.
Períodos [autores] analisados:
> Época Medieval
> Renascimento e Contra-Reforma
> As Luzes
> Do Século XIX até à Proclamação da República
> A Filosofia Portuguesa depois de 1910

quarta-feira, 25 de março de 2020

Confissões de mulheres apaixonadas... pela Filosofia!


[clique no link]
Interessantes testemunhos sobre o modo e o porquê do entusiasmo destas jovens mulheres pela Filosofia. 
"O pensar sobre o pensamento" fascinou a Isabel. Juntamente com a descoberta da Filosofia como esse lugar de liberdade, onde se refez das ditaduras que tanto a condicionaram.
Susana já lia Nietzsche desde os doze anos!
Luciana virou para a química, mas não pôde prescindir de questionar a natureza do átomo, da molécula... e aí entendeu que precisava de uma âncora que lhe respondesse a "algo mais" que a sua ciência, só por si, não lhe dava.
Juliana, já pressentia, como criança, juntamente com a sua beleza, a sua intrigante "diferença" no perguntar; era o insistente "porquê" que não mais a abandonaria.
Ana Cristina, também, desde muito jovem, representava o mundo e a sociedade como um grande palco, tudo encenado…  Tanta orquestração só a poderia atrair para a inevitável interrogação: o que é que isto tem de autêntico? Onde está a verdade?!
E assim a Filosofia faz mesmo caminho, encarnando nestes rostos, remexendo estas vidas. 
O sentido da religião, da política, da arte, do outro, da natureza, da razão, da finitude... e sempre, sempre, a construção da felicidade. São tantos os abraços da Filosofia!
Um conjunto de entrevistas a ver e problematizar. 

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Oriente e Ocidente: complementaridades religiosas em prol do ser humano

Diário do Minho, 04/12/2019, p. 16
[Texto publicado no Jornal Diário do Minho, 04.12.2019]


Passados uns bons pares de anos, surgiu-me recentemente a oportunidade de regressar à lecionação de uma das matérias da minha predileção: o pensamento oriental, na sua mescla mais genuína, feita de filosofia, religião e espiritualidade.
Nesta espécie de «regresso às origens» tive a graça de encontrar turmas motivadas pela matéria, a que não será estranha esta atração pelo Oriente da sabedoria, da meditação e do Yoga, dos Mestres iluminados, do relaxamento e da busca de cura para tanto sofrimento com que o estilo de vida ocidental nos tem esmagado…
Independentemente do assunto estar agora, segundo parece, muito na moda (sempre o considerei atual), o que é certo é que, grandes e sérios pensadores, ao longo da História, têm alertado para os riscos que emergem sempre que estas duas  metades do planeta se ignoram ou se hostilizam, em contraponto com os benefícios e vantagens provindos de uma visão holística e compreensiva das suas complementaridades, da unidade que lhes está subjacente.
Tem sido esta a linha hermenêutica que me tem guiado nos programas que tenho desenvolvido com as respetivas turmas. Partimos da ideia orientadora de que, mesmo quando se manifestam como tradições discordantes, pensamento oriental e pensamento ocidental contribuem, por isso mesmo e decisivamente, para uma visão mais completa do ser humano. Daí a importância de um conhecimento aprofundado das suas doutrinas matriciais, escolas, autores, e obras mais significativas.
A aceitação generalizada desta perspetiva interpretativa leva a que, hoje, não exista praticamente nenhuma área do conhecimento e da atividade humanas que não procure cruzar, mediante aprofundados estudos interculturais, as raízes e os legados da sabedoria oriental e da sabedoria ocidental (designação intencionalmente generalista), desde o âmbito da religião à economia, da estética à ciência, da arte à gestão, da literatura à política, etc.
Como demonstração dos benefícios deste pragmático estudo, que designo de “regime de complementaridades”, aqui deixo dois ou três exemplos que considero significativos.
O primeiro caso: um jovem estudante da Faculdade de Teologia de Braga, membro de uma Ordem Religiosa, que no ano transato integrava uma das turmas, entusiasmou-se pelo pensamento do filósofo chinês Mêncius, cuja Obra foi traduzida pelo eminente sinólogo Jesuíta, Pe. Joaquim Guerra. Este jovem encontrou nestes textos matérias, pontos de vista e orientações que lhe permitem estabelecer amplas pontes com o Cristianismo. 
O segundo caso, passou-se recentemente, no contexto da prestação de Provas de Mestrado em Estudos Interculturais Português/Chinês, de uma jovem chinesa, na Universidade do Minho. A jovem acabava de concluir brilhantemente a defesa da sua excelente dissertação, tendo comparado o catolicismo e o protestantismo na China e em Portugal. Já em descontraído diálogo, finalizadas as formalidades académicas, perguntei-lhe em que tipo de ocupação laboral pensava ela aplicar os conhecimentos da sua tese. No meu imaginário, presumia que o leque não fosse muito além de um hipotético trabalho na área do ensino, ou numa Igreja… Pois, qual o espanto quando me responde que não, o que ela almeja é mesmo integrar, como tradutora, os quadros de uma empresa, no sector industrial, ou no comércio… Mas, e porquê esta aquisição de bagagem de cultura religiosa? Não seria muito mais adequado ter investigado doutrinas da economia, da gestão, do direito…? O mistério esclarece-se rapidamente, na graciosidade da sua pronta resposta: «sem conhecermos a estrutura religiosa dos povos, não entendemos nada do ser humano!» Eis um axioma universal, tanto lá como cá – tem toda a razão!
Finalmente, para reforço deste “regime de complementaridades”, indico duas significativas referências bibliográficas atuais.
A primeira publicação tem como autor Stephan Rothlin S.I. e intitula-se “La dottrina sociale della Chiesa in Cina, Un riferimento per l’etica degli affari” (La Civiltà Cattolica, 2019, I, nº 4046, pp. 129-140). Neste artigo é revisitado o documento A vocação do gestor - publicado pelo então Pontifício Conselho da Justiça e Paz em 2011 e recentemente traduzido para chinês - para evidenciar o papel da Doutrina Social da Igreja na construção de um quadro de referência para a ética dos negócios internacionais. Mostra, também, como esta Doutrina se pode ligar à filosofia moral confuciana, em modalidades que asseguram especificamente um melhoramento da ética comercial internacional na China.
A segunda publicação é um longo estudo de quase 400 páginas do autor Zhang Yunliang, intitulado “Lao Tzu and the Bible. Valutazione critica dell’opera di Yuan Zhiming” (Rivista Sacra Doctrina, vol. 62, fasc. 2, 2017). Como o título indica, trata-se de um profundo estudo comparado das religiões taoista e cristã, centrado na obra de Yuan Zhiming. Para além de outros aspetos, é um trabalho de grande valor para a compreensão da evangelização e da inculturação na China.
A quem interessar, estas duas publicações periódicas podem ser consultadas na Biblioteca da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da UCP. [Carlos Bizarro Morais]
Alunos do Seminário Temático em "Espiritualidades Orientais" - Faculdade de Teologia / Braga